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A evolução geológica da Chapada Diamantina

Este artigo, que discorre sobre a evolução geológica da Chapada Diamantina, é o terceira post da série de tópicos relacionados à origem dos diamantes da região.

É uma continuação das seguintes postagens: 1 – Os Diamantes e Seus Mistérios na Chapada Diamantina e 2 – Histórico da Exploração na Chapada dos Diamantes.

Introdução

A natureza necessitou de um longo período geológico para esculpir a exuberante paisagem do santuário ecológico conhecido como Chapada Diamantina.

A rica história da geologia local é repleta de intensas atividades tectônicas e antigos vulcões. A área já foi palco de diversificados ambientes: grandes rios entrelaçados, mares (rasos e agitados), desertos, dunas e zonas glaciais.

Infere-se que essa região, inserida no supergrupo orográfico serra do Espinhaço, tem uma formação geológica que remonta a uma idade superior há 1 bilhão e setecentos milhões de anos.

O estudo das rochas locais evidencia uma evolução complexa ao longo do tempo. Os métodos utilizados para as datações dos eventos baseiam-se nos estudos de fósseis, de registros geológicos e datação radiométrica.

A consolidação da Chapada ocorreu sobre uma área estabilizada

A Chapada Diamantina está encravada em uma área estabilizada do continente sulamericano denominada Cráton do São Francisco (figura 1). Os Crátons são regiões continentais estáveis onde não acontecem eventos tectônicos a um longo período geológico.

Nesta figura, em destaque o Cráton do São Francisco (seta). O ítem 4 corresponde à Chapada Diamantina. (Chaves e Brandão, 2004)

Neste cráton encontra-se o Bloco Gavião, um terreno com rochas graníticas e gnaisses bastante antigas, que é o embasamento cristalino sobre o qual todo o edifício geológico regional foi naturalmente erguido e consolidado.

Evolução geológica da Chapada Diamantina

As fases geológicas evolutivas da Chapada Diamantina ocorreram após a estabilização do Cráton do São Francisco e a partir da ruptura de um supercontinente chamado Columbia por volta de 1,75 bilhão de anos.

Esta ruptura, desencadeada por eventos energéticos internos do planeta, gerou processos magmáticos e bacias que abrigaram os sedimentos terrígenos e de origem vulcânica do Supergrupo Espinhaço, desenvolvidos antes e durante os eventos.

A Serra das Almas, localizada no município de Rio de Contas, abriga rochas formadas por deposição de material de origem vulcânica e sedimentar, que se constituíram entre 1,75 a 1,7 bilhão de anos (Ga) – (Figuras 2A, B e C).

Evolução geológica da Chapada Diamantina
2A) Lagoa em Livramento de Nª Senhora-Ba com vista para a Serra das Almas – Coord. UTM: 191630mE/ 8491030mN. N 032º. (Imagem: Ricardo Borges)
Evolução geológica da Chapada Diamantina
2B) Vista de cristas da Serra das Almas a partir do morro da antena em Rio de contas – Chapada Diamantina, Bahia – Coord.: UTM192657mE/8495017mN. (Imagem: Ricardo Borges)
2C) Vale suspenso – Rio de Contas-Ba – Coord.: UTM192657mE/8495017mN. (Imagem: Ricardo Borges)
  • A sedimentação regional após a fase de abertura da bacia (fase pós-rift), encontra-se abaixo subdividida:

1º Estágio (1,6 Ga): mudanças climáticas e alterações do nível do mar

No início da era Mesoproterozoica (1,6 a 1,0 Ga), grandes rios, desertos, lagos, paleodunas e interdunas dominavam a exótica paisagem da Chapada Diamantina.

Nessa fase, implantou-se, a oeste da região, uma planície aluvial com caudalosos rios entrelaçados, característicos de climas secos.

Essa planície estava associada lateralmente a um deserto repleto de lagos temporários, onde também predominavam dunas e interdunas.

As atividades geológicas foram influenciadas pela eustasia (alterações do nível do mar) e por modificações paleoclimáticas. Predominava um ambiente hostil quando o clima transformou-se em árido, desértico.

A 1º sequência deposicional estava associada a sedimentos continentais, com deposição de cascalho e areias provenientes de antigos rios, e a partir do transporte eólico – típicas de dunas. Esta intercalação de depósitos formou os arenitos bimodais. As lamas representavam as interdunas.

Evolução geológica da Chapada Diamantina - Morros testemunhos erosivos da Serra do Sincorá na Chapada Diamantina-Ba, sustentados por arenitos e siltitos de origem continental e marinhos (Mesoproterozoico). Visada norte a partir do morro do Pai Inácio. (imagem: pixabay)
Figura 3 – Morros testemunhos erosivos da Serra do Sincorá na Chapada Diamantina-Ba, sustentados por arenitos e siltitos de origem continental e marinhos (Mesoproterozoico). Visada norte a partir do morro do Pai Inácio. (Reprodução: pixabay)

A 2º sequência deposicional assentou-se sobre a sequência anterior. Os sedimentos eram originários de costa continental e marinha, depositados na forma de lamas, com silte e areia subordinados. Predominavam ambientes de transgressões marinha rasa e litorâneo.

Estas sequências podem ser observadas na região do morro do pai Inácio e nos vales do Capão e Paty (figuras 3 e 4).

O entendimento das mudanças climáticas de grande escala da atualidade pode ser incrementado a partir do estudo e conhecimento das alterações marinhas e do paleoclima que transcorreram na região no mesoproterozoico.

Evolução geológica da Chapada Diamantina - Detalhe dos vales profundo e morros testemunhos mesoproterozoicos do anticlinal do Pai Inácio, na Serra do Sincorá, Trilha Lençóis-Capão.
Figura 4 – Detalhe de vale profundo e morros testemunhos mesoproterozoicos do anticlinal do Pai Inácio, na Serra do Sincorá, Trilha Lençóis-Capão. Visada NE. (imagem: Ricardo Borges)

2º Estágio (1,5 Ga): processos tectônicos e surgimento de cordilheiras

Neste estágio, movimentos tectônicos dinâmicos geraram cordilheiras a leste, representadas pela serra da Jacobina e pelo complexo Contendas-Mirante.

Em função desse evento, o declive regional remanescente foi invertido e possibilitou o surgimento dos arenitos e conglomerados diamantíferos da Formação Tombador (um conjunto de rochas portadora dos requisitados diamantes).

Os leques de cascalhos que originaram os conglomerados coletores dos diamantes encontrados nas regiões de Lençóis, Andaraí e Mucugê, consolidaram-se a partir da erosão dos blocos que eram alçados da crosta nas periódicas instabilidades do terreno (figura 5).

Figura 5 – Feições de dissolução do tipo marmitas e caldeirões (setas) nos conglomerados diamantíferos da Formação Tombador no Serrano, leito do rio Lençóis, município de Lençóis-Ba. Coordenadas UTM 239380mE 8610053mN. Visada N040º. (imagem: Ricardo Borges)

3º Estágio (1,3 Ga a 1,0 Ga): Invasão do Mar Caboclo

A vocação marinha do estado da Bahia é observada desde os primórdios. E até o sertão na região da Chapada Diamantina, por volta de 1,1 bilhão de anos atrás, já foi mar.

Um mar denominado “Mar Caboclo” que se expandiu pelo lado norte da Chapada Diamantina, invadiu e recobriu a Formação Tombador, viabilizando o retrabalhamento dos seus sedimentos continentais.

Este evento produziu um novo conjunto de rochas, denominado de Formação Caboclo. As estruturas sedimentares e as estratificações desta formação geológica indicam uma origem a partir da deposição dos sedimentos em uma plataforma marinha, dominada por ondas.

A hipótese de invasão marinha é consubstanciada pelas feições nas rochas, que indicam antigas atividades de marés, a exemplo de marcas de ondas e estratos com camadas cruzadas.

Estas evidências apresentam-se em afloramentos rochosos de arenitos bem selecionados nas bordas da serra do Sincorá, entre a região de Lençóis e o sul de Andaraí.

Pantanal do Marimbus com a bela Serra do Sincorá e seus relevos serranos ao fundo.
Figura 6 – Pantanal do Marimbus – Andaraí, com a bela Serra do Sincorá e seus relevos serranos ao fundo. Coordenadas UTM 249050mE 8588111mN. Visada NW. (imagem: Ricardo Borges)

4º estágio (970 Ma): Período glacial e o mar Bambuí

Esta etapa da evolução geológica da Chapada Diamantina é marcada por ampla glaciação que interrompeu a acumulação de sedimentos. O prenúncio deste período glacial, também conhecido como “Terra bola de neve“, foram as variações eustáticas do nível do mar.

Este episódio é de crucial importância para a consolidação das rochas conglomeráticas e pelitos da Formação Bebedouro – um conjunto de rochas glaciais do semi-árido baiano de idade neoproterozoica (1,0 Ga a 541 Ma).

Após o encerramento da glaciação do período criogeniano (850 a 635 Ma), sucedeu-se outra importante inundação marinha. Um mar raso (Bambuí) recobriu toda a área a leste da região, onde localizam-se as cidades de Nova Redenção e Itaetê.

Este episódio originou os calcários e dolomitos da plataforma carbonática da Formação Salitre, que balizam as partes leste e sul da serra do Sincorá.

A dissolução desses calcários, proporcionou a formação das cavernas, a exemplo da Torrinha, Gruta Azul e Poço Encantado, e de seus magníficos espeleotemas ( Figura 7).

Evolução geológica da Chapada Diamantina - Poço Encantado em Itaetê - gruta formada por dissolução dos calcários originados por inundações marinhas após os períodos glaciais do criogeniano
Figura 7 – Poço Encantado em Itaetê – gruta formada por dissolução dos calcários originados por inundações marinhas após os períodos glaciais do criogeniano – 850 a 630 Ma.
(imagem: Ricardo Borges)

5º Estágio (570 a 65 Ma): cobertura e depósitos colúvio-aluvionares

Nesta última fase, contida entre as eras paleozoica (542 a 251 Ma) e mesozoica (251 a 65,5 Ma) – período da separação da Pangeia e reinado dos dinossauros, não foram encontrados registros importantes de deposição sedimentar na área.

As formações rochosas anteriormente embasadas foram recobertas por depósitos de material transportado pela ação gravitacional (colúvios), por cobertura residuais, e aluviais provenientes de sedimentos do Neógeno (23,3 a 1,8 Ma) e recentes de idade quaternária.

A partir deste instante, até os dias atuais, nenhum evento geológico significativo gerou alterações nas feições geomorfológicas da Chapada Diamantina.

As únicas modificações recentes são as decorrentes das atividades exploratórias antrópicas. A desorganizada exploração dos metais e minerais preciosos deixaram cicatrizes profundas.

A descaracterização paisagística da Chapada Diamantina é contínua e perceptível, num ambiente cuja evolução geológica foi forjada pela dinâmica do planeta ao longo de um bilhão e setecentos milhões de anos.

Foto da capa: Gruta Azul, Iraquara – Ba (autor desconhecido)

Referências

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BOMFIM, Luiz Fernando Costa; CAVEDON, Ari D. Projeto Chapada Diamantina: Parque Nacional da Chapada Diamantina – BA, Informações Básicas para Gestão Territorial: Diagnóstico do Meio Físico e da Vegetação. Salvador: CPRM/IBAMA, 1994. 104 p., 9 mapas. in http://www.cprm.gov.br/

CHAVES, Mário Luiz de Sá; BRANDÃO, Paulo Roberto Gomes. Diamante variedade carbonado na serra do Espinhaço (MG/BA) e sua enigmática gênese. Rem: Rev. Esc.Minas, Ouro Preto , v. 57, n. 1, p. 33-38, Mar. 2004.

GUIMARÃES, J. T., SANTOS R. A., MELO R. C. Geologia da Chapada Diamantina (Projeto Ibitiara-Rio de Contas). Salvador, CBPM/CPRM, Série Arq. Abertos 31, 64p. 2008.

MARTINS, Violeta S.; FERREIRA, Rogério V.; GONÇALVES, Thiago S.; ESPINHEIRA, Antônio R. L.; COSTA, Carlos A. S.; COMERLATO, Fabiana. Geoparque Alto Rio de Contas (BA) – Proposta. CPRM, 2017.

MISI, Aroldo e SILVA, Maria G. Chapada Diamantina Oriental – Bahia. Geologia e Depósitos Minerais. Secretaria da Indústria, Comércio e Mineração/ Superintendência de Geologia e Recursos Minerais, 1996.

NANNINI, F.; NETO, Izaac C.; SILVEIRA, Francisco V.; CUNHA, Lys M.; OLIVEIRA, Roberto G. Projeto Diamante Brasil – Áreas Kimberlíticas e Diamantíferas do Estado da Bahia. CPRM – Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, Brasília, 2017.

PEDREIRA, Augusto J. A Chapada dos Diamantes – Serra do Sincorá, Bahia. 2002. In: Schobbenhaus, C.; Campos, D.A.; Queiroz, E. T.; Winge, M.; Berbert-Born, M. Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil. http://www.unb.br/ig/sigep/sitio085/sitio085.htm

PEREIRA, Ricardo Galeno F. A.; ROCHA, Antonio J. D.; PEDREIRA, Augusto J. Geoparque Serra do Sincorá (BA) – Proposta. MME-CPRM, 2017.

Ricardo Borges

Economista, geólogo e músico autodidata. Trabalha com publicidade e consultoria em marketing digital. Criador de conteúdo e pesquisador nas áreas de geociências e astronomia.

13 thoughts to “A evolução geológica da Chapada Diamantina”

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