Os fiordes modernos se originaram a partir da poderosa erosão glacial das geleiras do Quaternário sobre complexos rochosos cristalinos do Paleozoico, propiciando a formação de suntuosas e exóticas paisagens, como as observadas na Noruega.
Este texto contém uma síntese ilustrada da interessante história geológica do “topo do mundo” da mitologia Viking: que engloba o fechamento do Oceano de Jápeto, a colisão de três micro continentes (incluindo a lendária Península de Avalon), a formação das montanhas escandinavas, e a posterior origem glacial dos fiordes.
Conforme as escritas mitológicas nórdicas das Eddas, nessas regiões de elementos geomorfológicos peculiares – com belíssimos fiordes, circos glaciais, vales, escarpas e imponentes falésias, se sucederam fantásticas batalhas entre deuses e gigantes.
Orogenia Caledoniana e os complexos rochosos da Escandinávia
As cadeias montanhosas da Escandinávia, do Norte Europeu e da América do Norte foram edificadas durante a chamada Orogenia Caledoniana, ocorrida entre cerca de 490 a 390 milhões de anos atrás, na era Paleozoica.
Esses eventos foram decorrentes do fechamento do Oceano Jápeto, a partir da convergência de placas litosféricas continentais da Laurência, Báltica e Avalônia.
Em seguida ao desaparecimento do antigo oceano, os crátons dos três paleocontinentes formaram uma massa de terra única denominada de Laurussia ou Euroamérica (Figura 2). Em fase posterior, essa massa continental foi agregada ao supercontinente Pangea.
Após o deslizamento por subducção da antiga placa oceânica de Jápeto, as colisões continentais subsequentes na Laurussia proporcionaram a geração das longas e dobradas cadeias de montanhas (orogênese) dos Alpes Escandinavos, com ocorrência de metamorfismo em fácies eclogíticas.
Em zonas de forte compressão, em função do choque de placas tectônicas, ocorrem falhas reversas (falhas de empurrão) e dobramentos. Nos limites convergentes, geralmente transcorrem processos de obducção, que possibilitam a movimentação de lascas rochosas do embasamento de antigas crostas oceânicas e do manto superior para as partes elevadas da crosta continental.
Esses antigos fragmentos rochosos são conhecidos como ofiolitos, e podem ser encontrados a grandes altitudes em algumas cadeias escarpadas. Na península norueguesa de Folgefonn são encontradas rochas do pré-cambriano no topo de montanhas com mais de 1500 metros de altura, sobre filitos mais jovens.
As zonas de cisalhamento também compreendem importantes estruturas geológicas da Noruega, e estas estruturas tectônicas, contrastes rochosos e presença dos ofiolitos do embasamento pré-cambriano nos afloramentos são visivelmente notáveis a partir dos fiordes.
Tectonismos, desnudação e peneplanação
Após a formação das imensas e longas cadeias de montanhas e cordilheiras entre 420 e 400 Ma (períodos Siluriano e Devoniano), as mesmas apresentavam altitudes semelhantes às encontradas nos tempos atuais no Himalaia, acima de 8.000 metros.
Tectonismos, reversão de falhas e colapsos gravitacionais por volta de 400 Ma, contudo, promoveram a redução da espessura da crosta. Os movimentos tectônicos geraram o afinamento da corrente montanhosa, que também sofreu processos de intemperismo e desgaste erosivo da superfície (desnudação), quando da inclusão da cadeia ao Pangea.
Com a continuação da erosão, ocorreu a redução da cadeia, gerando o processo de peneplanação. Por volta de 50 milhões de anos, aconteceu novo levantamento tetônico da pleneplanície, que gerou os atuais contornos de altitude dos Alpes Escandinavos (Figura 3).
Geleiras e implantação dos Fiordes
Derivado do idioma norueguês – fjord, os fiordes são grandes entradas de mar com penetração das águas em antigos vales glaciais por entre altas montanhas rochosas. Essas enormes entranhas no relevo podem chegar a centenas de quilômetros costa adentro.
Esta geomorfologia, que apresenta abruptos desníveis, é advinda de dinâmico trabalho glacial erosivo, oriundo de geleiras das glaciações do Quaternário, que formaram profundos vales, muitos deles deprimidos abaixo do nível do mar atual.
A movimentação de imensas massas de gelo pretéritas rumo ao mar, em função da força gravitacional, geraram circos glaciais, vales e fiordes, e as cênicas paisagens regionais da atualidade. Esses glaciares continham alto potencial erosivo e arrastavam material sedimentar de natureza diversificada, principalmente proveniente das rochas ígneas e gnáissicas menos resistentes das altas montanhas.
Além da ação da gravidade, o movimento das geleiras é também decorrente das propriedades de escoamento da água no estado sólido, cujo retículo cristalino em forma de gelo proporciona menor densidade.
Os principais países que abrigam os emblemáticos fiordes em seus territórios são a Noruega, Groelândia, Chile e Nova Zelândia. A costa oeste da Noruega, também conhecida como o país dos fiordes, é bastante dissecada e apresenta grande número de vales glaciais invadidos pelo mar.
Glaciações do Quaternário e mudanças climáticas
O esculpimento final do arcabouço geológico dos fiordes modernos remonta ao último período glacial – Glaciação Wisconsin ou de Weichsel (Escandinávia), ocorrido no final do pleistoceno (entre 110 mil a 11.000 anos).
Após as mudanças climáticas que decretaram o encerramento da mais recente era do gelo, as águas dos mares ocuparam as antigas bacias deprimidas e espaços escavados na costa montanhosa continental pela força geológica glacial (Figura 4).
Conclusão
Ao longo de milhões de anos, a natureza forjou as atuais formas do relevo e paisagens da mítica Noruega, país que apresenta muitas atrações geoturísticas, a exemplo dos monumentais lagos glaciais, fiordes e intrigantes complexos rochosos.
As principais etapas da formação geológica da região abrangem: o fechamento do Oceano Jápeto; a colisão continental da Laurência, Báltica e Avalonia; a formação de grandes cadeias de montanhas e da cordilheira dos Alpes Escandinavos; tectonismos e desnudação por erosão ao longo de milhões de anos; redução e peneplanação da antiga cordilhiera; e erosão glacial com a formação de vales profundos e posterior preenchimento marinho dos fiordes.
Os imponentes paredões de rochas cristalinas do antigo topo do mundo, apresentam grandes desníveis e impressionantes fendas e patamares, que bem poderiam ser as secretas passagens e pontes do portal da Bifrost Viking, que possibilita o elo dimensional entre o domínio dos Deuses mitológicos nórdicos – Asgard e a Midgard.
- Este artigo faz parte de um conjunto de textos do Explorando os encantos naturais do velho mundo a ser integrado em e-book
Imagem da capa: o Trolltunga (lingua de troll), um dos principais pontos turísticos da Noruega, que situa-se a 700 metros acima do lago Ringedalsvatnet. (autor desconhecido)
- Para maiores informações sobre erosão proveniente de glaciares, consultar o post: A erosão glacial esculpiu belos lagos.
- Gostou deste artigo? então ajude-nos com qualquer valor para a manutenção e continuação do site, através do PIX: 71996176741 / BIZUM: 34 600429712
Referências
Claes Grundsten e Göran Palmgren, Fjällboken, Estocolmo, Norstedt, 2010
Helland-Hansen, W. et al. (red.): Naturhistorisk vegbok for Hordaland. Bergen Museum-Nord 4. 2004.
Karianne Lilleøren. «Fjord» (em norueguês). Store norske leksikon (Grande Enciclopédia Norueguesa)
https://pt.frwiki.wiki/wiki/Alpes_scandinaves
https://stunningoutdoors.com/hiking-preikestolen-in-summer/
https://www.fjords.com/the-hardangerfjord-area-geology-and-landscape/
One thought to “Os monumentais fiordes e complexos rochosos da Noruega”