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Vestígios de eras glaciais na Chapada Diamantina

Vestígios de eras glaciais na Chapada Diamantina

Notável por conter ampla riqueza natural e mineral, essa esplêndida região tropical brasileira também é referência no estudo de gélidos paleoambientes. Os indicadores de antigas eras glaciais na Chapada Diamantina afloram em vários locais, e o semiárido baiano abriga um complexo rochoso que se originou em períodos de glaciação – a formação Bebedouro, configurada entre 750 e 650 milhões de anos atrás.

Grandes glaciações da era Neoproterozóica (1,0 Ga a 541 Ma)

Entre 850 e 650 milhões de anos atrás, no período criogeniano, supõe-se que ocorreram duas grandes glaciações globais: a Sturtiana e a Marinoana. Algumas hipóteses, a exemplo da Terra bola de neve, contemplam a possibilidade destas glaciações terem coberto toda a Terra.

Em muitas regiões entre trópicos do planeta existem vestígios deste período. Nas plagas tropicais da Chapada Diamantina também existem indícios de ocorrência de um amplo período glacial que remonta à essa época, e que precedeu uma invasão marinha rasa (o mar Bambuí).

Formação Bebedouro

Estas evidências são atestadas pela presença de rochas ferríferas em bandas, rochas conglomeráticas e pelitos da formação Bebedouro – um conjunto de rochas glaciais do semi-árido baiano de idade neoproterozoica (Figura 1).

Vestígios de eras glaciais na Chapada Diamantina
Figura 1: Diamictito glacial da formação Bebedouro. Afloramento na BR-242. (https://www.geoparquecostoeselagunas.com/geoparque-serra-do-sincora/ Imagem: Ricardo Pereira)

De acordo com dados cronoestratigráficos fornecidos por Babinski et al (2004), a formação Bebedouro encontra-se na base do grupo geológico Una, consolidado a partir da tafrogênese Toniana, que ocorreu há aproximadamente 875 Ma. Este evento desencadeou a formação de bacias geológicas.

Com espessura máxima em torno de 100 metros, esta formação se situa na Bacia de Irecê. É composta essencialmente por sedimentos de natureza glacial e terrígenos (diamictitos, arenitos, siltitos e folhelhos), originários de deposição marinha e de delta de rios, ambas glaciogênicas (SAMPAIO, 1994; BARBOSA, 2012).

As principais características geológicas encontradas no litotipo predominante, os diamictitos, são estruturas oriundas da erosão e transporte glacial, a exemplo de estrias, presença de grandes fragmentos dispersos, e clastos de tamanhos variados e mal selecionados (Figura 2).

Fagmentos glaciais oriundos da Terra bola de neve
Figura 2: indicadores de atividades geológicas glaciais, com presença de clasto com estrutura “ferro de passar” (seta) em matriz lamítica, síltico-argilosa, nos diamictitos da Formação Bebedouro. Região de Jacobina-Ba – fazenda na Ba-368. (Imagem: Ricardo Borges)

Mudanças climáticas e formação de mares

As datações e posições estratigráficas determinam que as formações rochosas de origem glacial, espalhadas nas zonas tropicais do planeta, apresentam idade superior ao das rochas carbonáticas. Significa então que após um longo período de glaciações na era Neoproterozoica, ocorreram mudanças climáticas.

A Terra entrou numa fase de superaquecimento, que derreteu as calotas de gelo, com alteração no nível eustático dos mares. Novos ambientes marinhos se formaram, a exemplo do mar Bambuí, que se espraiou a leste da Serra do Sincorá na Chapada Diamantina.

Este período de transição, desencadeado após o rompimento do supercontinente de Rodínia, é de extrema importância na história terrestre. A partir de 580 milhões de anos atrás, teve início a etapa conhecida como explosão Cambriana, com grande florescimento e diversificação da vida.

Mares rasos surgiram doravante o descongelamento. Estas regiões marinhas abrigaram uma profusão vital que posteriormente tornaram-se fósseis, fomentando a consolidação das rochas carbonáticas.

Estes tipos de rochas são típicas de ambientes com temperaturas mais elevadas. Nos estratos rochosos, formaram capas sobre os sedimentos e rochas do período glacial.

Na Bahia, a formação Salitre – constituída por carbonatos, é o estrato sucessor às rochas glaciogênicas da formação Bebedouro, consolidando o ciclo de rochas regionais do Grupo Una e da Chapada Diamantina (Figura 3).

Figura 3: localização regional das unidades geológicas da Chapada Diamantina. A formação Bebedouro está contida no Grupo Una, na legenda em lilás. Fonte: Pereira et al., (2017)

Referências

BABINSKI, M.; LIU, D.; TRINDADE, R. I. F.; BRITO NEVES, B. B. & SANTOS, R. V. Idade e proveniência dos sedimentos glaciais da Formação Bebedouro, Cráton do São Francisco, com base em dados U-Pb SHRIMP em zircões detríticos. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 42, 2004, Araxá, MG. Anais…, SBG, 2004. Disponível em: https://repositorio.usp.br/item/001409490.

BARBOSA, Johildo S.F., FREITAS, Juracy M., CORREA, Luiz G., DOMINGUEZ, José e SOUZA, Jailma. Geologia da Bahia. Pesquisa e Atualização, Volume 2. CBPM, 2012.

PEREIRA, Ricardo Galeno F. A.; ROCHA, Antonio J. D.; PEDREIRA, Augusto J. Geoparque Serra do Sincorá (BA) – Proposta. MME-CPRM, 2017.

SAMPAIO, Deomar R.; COSTA, Evandro D. A.; NETO, Manoel C. A.; PEDREIRA, Augusto J.; MIRANDA, Luiz L. F. de. Diamantes e Carbonados do alto rio Paraguaçu: geologia e potencialidade econômica. Salvador. CBPM, 1994.

Ricardo Borges

Economista, geólogo e músico autodidata. Trabalha com publicidade e consultoria em marketing digital. Criador de conteúdo e pesquisador nas áreas de geociências e astronomia.

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