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Os mares ancestrais da Chapada Diamantina

Os mares ancestrais da Chapada Diamantina

O estado da Bahia já demonstrava vocação marinha desde os primórdios geológicos da natureza. E até os terrenos sertanejos da Chapada Diamantina, conforme apregoam as ressonâncias literárias, já abrigaram grandes mares ancestrais.

De acordo com análises em rochas da região ao longo das últimas décadas, e da presença de material fóssil, os geocientistas estimam que após a formação da serra do Espinhaço existiram dois grandes paleomares que cobriram extensa área.

Um de características agitadas – o mar Caboclo, e o outro de águas calmas – o mar Bambuí.

Antes da consolidação do edifício geológico da Chapada Diamantina, provavelmente existiu um mar, em uma bacia alongada, que foi denominado de mar Espinhaço (há 1,75 bilhão de anos). Ele foi fruto da ruptura do primeiro supercontinente da Terra – o Colúmbia, que instaurou uma grande fenda (rift) na região.

Mas boa parte desse mar gradualmente foi soterrado por espessas camadas de material sedimentar e vulcânico, que afloravam através da fenda, e que originaram o primeiro grupo de rochas da Chapada – Grupo Rio dos Remédios (Figura 1).

Como essa fenda não evoluiu para formar uma crosta oceânica, as constantes atividades tectônicas e magmáticas das fases rift e pós-rift preencheram a bacia. E a região tornou-se um rift abortado (que não virou oceano), conhecido como o Aulacógeno do Paramirim.

mares ancestrais da Chapada Diamantina
Figura 1 – Carta estratigráfica e informações tectonodeposicionais do Supergrupo Espinhaço na Chapada Diamantina, com inclusão da Formação Serra da Gameleira, que representa a fase pré-rift. (Fonte: Guimarães et al. (2008).

Mares ancestrais da Chapada Diamantina

Mar Caboclo (≅ 1,1 bilhão de anos)

No período Mesoproterozoico um mar agitado denominado Caboclo, que se expandiu pelo lado norte da Chapada Diamantina, invadiu e recobriu as rochas da diamantífera Formação Tombador, viabilizando o retrabalhamento dos seus sedimentos de origem continental.

Possivelmente, a gênese do mar Caboclo está associada a processos de aumento do nível do mar e transgressões marinhas, que promoveram a instalação de uma planície de maré de alta energia. Este ambiente era anteriormente uma planície fluvial, em uma bacia que se formou por reflexo de processos tectônicos na frente da cadeia montanhosa.

Este evento marinho produziu um novo conjunto de rochas, denominado de Formação Caboclo. As estruturas sedimentares e as estratificações dessa formação geológica indicam uma origem a partir da deposição dos sedimentos em uma plataforma marinha, dominada por ondas.

Alguns pesquisadores consideram que as rochas da Formação Caboclo foram depositadas em ambiente marinho raso dominado por tempestades (alta energia). Ela é constituída por intercalações rítmicas de arenitos, siltitos (grãos minerais tamanho silte) e argilitos.

A hipótese de invasão marinha é consubstanciada pelas feições nas rochas, indicativas das atividades de marés, a exemplo de marcas de ondas e estratos com camadas cruzadas (Figura 2).

Mares ancestrais da Chapada Diamantina
Figura 2 – camadas tabulares alternadas (rítmicas) de metapelito e metarenito com estratificação cruzada. BR-324, trecho Jacobina-Lajes do Batata. (Fonte: Barbosa et al, 2012)

Estas evidências apresentam-se também em afloramentos rochosos de arenitos bem selecionados nas bordas da serra do Sincorá, entre a região de Lençóis e o sul de Andaraí.

Mar Bambuí (≅ 600 milhões de anos)

Após o encerramento da superglaciação do período criogeniano (850 a 635 Ma), com mudanças climáticas que tendiam ao aquecimento global, as grandes placas de geleiras derreteram. Destarte, ocorreu outra importante inundação marinha regional.

Um grande mar raso, o Bambuí, recobriu grande parte do sertão, regiões de alguns estados, como Minas Gerais, e toda a área ocidental da serra do Sincorá, onde atualmente localizam-se os municípios de Nova Redenção e Itaetê (Figura 3).

Figura 3 – Em vermelho, região onde atualmente se encontram as rochas do Grupo Bambuí, oriundas do período da existência do homônimo mar. (Foto reprodução: Revista Galileu)

Nesta época, a América do sul, Antártida e África estavam unificadas no Gondwana. A penetração e transgressão marinha pode ter ocorrido a partir de um paleoceano que separava a Amazônia do Gondwana, chamado de Clymene.

O mar Bambuí possivelmente era semelhante ou mais raso que o atual mar do Caribe. Apresentava características calmas e propícias ao florescimento de estromatólitos e colônias de microorganismos fotossintetizantes, formadores de estruturas carbonáticas típicas de recifes.

Este episódio originou, em função da precipitação do carbonato de cálcio, a deposição no fundo marinho de muitas camadas sedimentares que formaram os calcários e dolomitos da plataforma carbonática da Formação Salitre.

A dissolução desses calcários, proporcionou a formação das conhecidas cavernas cársticas na região, e de seus magníficos espeleotemas. Muitos fósseis mais antigos são encontrados no setor norte da Chapada Diamantina, em Morro do Chapéu.

Imagem da capa: Prehistoric Club Moss – Richard Bizley

Ricardo Borges

Economista, geólogo e músico autodidata. Trabalha com publicidade e consultoria em marketing digital. Criador de conteúdo e pesquisador nas áreas de geociências e astronomia.

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