Já imaginaram a Terra praticamente coberta por gelo? A hipótese da Terra bola de neve surgiu em função das evidências de depósitos de sedimentos glaciais existentes em várias regiões de latitudes tropicais do planeta.
Supõe-se que essa fase histórica da Terra, quando ocorreram duas grandes glaciações globais (Sturtiana e Marinoana), e que provavelmente não foram contínuas, se sucedeu em tempos bem mais remotos do que as tradicionais eras do gelo, geologicamente mais recentes.
Esses megaeventos, que provavelmente foram as alterações climáticas mais drásticas da história natural terrestre, aconteceram entre 850 a 630 milhões de anos atrás, num período geológico conhecido como criogeniano. Termo oriundo da criogenia (origem a partir do gelo).
Durante a época das superglaciações e da provável Terra bola de neve, a maior parte das porções continentais do planeta estavam unidas em um supercontinente conhecido como Rodínia.
Essa etapa de massas continentais unificadas, e com posicionamento em proximidade à linha do Equador, pode ter proporcionado o congelamento de praticamente toda superfície da crosta continental terrestre da época (Figura 1).
Sedimentos glaciais e antigos mares
Esta hipótese, inicialmente formulada pelo professor Paul Hoffman, da Universidade de Harvard, surgiu a partir de estudos relativos aos campos magnéticos da pretérita Terra, e da existência de resquícios de rochas glaciais em várias regiões tropicais do planeta.
Através de evidências paleomagnéticas é possível a determinação da provável latitude quando da formação das rochas sedimentares. Os minerais magnéticos nas rochas tendem a se alinhar ao campo magnético terrestre que reinava no período.
Pesquisas baseadas nesses indícios determinaram que sedimentos de origem glacial, pertencentes a era em questão – o Neoproterozóico (1,0 Ga a 541 Ma) foram depositados a 10º do equador.
Estes sedimentos constantemente são encontrados em diversos lugares da Terra. Geralmente, localizam-se abaixo de rochas carbonáticas, que são oriundas de ambientes marinhos rasos, pertencentes ao período pré-cambriano.
Surgiu então a questão, diretamente atrelada à extrema mudança da temperatura média planetária: como sedimentos típicos de regiões da Antártida estariam depositados abaixo de sedimentos exemplares de regiões tropicais marinhas?
Vestígios na Chapada Diamantina – Brasil
Na região tropical baiana da Chapada Diamantina no Brasil, existem indícios de um amplo período glacial, que sucedeu uma antiga invasão marinha rasa (mar Bambuí), e que remonta ao período criogeniano.
Estas evidências são atestadas pela presença de rochas ferríferas em bandas, rochas conglomeráticas e pelitos da Formação Bebedouro – um conjunto de rochas glaciais do semi-árido baiano de idade neoproterozoica (1,0 Ga a 541 Ma).
Glaciação global
Modelagens computacionais recentes embasam a hipótese da Terra bola de neve. Em simulações digitais observa-se que quando uma glaciação é bastante intensa e satisfatória para que as geleiras atinjam cerca de 30 ° nas latitudes norte e sul, ocorre significativo incremento do albedo.
Este acréscimo do albedo, que é a capacidade de reflexão da luz solar por um planeta, proporciona que grande parte da energia do sol seja refletida de volta para o espaço. Esta condição promove mais resfriamento planetário, e, consequentemente, intensifica a glaciação.
Possíveis causas
O nosso artigo – Os aquecimentos e resfriamentos cíclicos da Terra, agrega uma maior compreensão dos fenômenos astronômicos e geológicos que geram alterações climáticas globais, e que podem ter ocasionado estes períodos superglaciais.
Entre eles, podemos elencar como principais: o impacto de um grande meteorito; as erupções vulcânicas em grande escala – ambas causas bloqueariam a penetração da luz solar na superfície terrestre; e a drástica redução dos gases do efeito estufa e oscilações das atividades solares.
Superaquecimento e a explosão da vida
As datações e posições estratigráficas determinaram que formações de origem glacial espalhadas nas zonas tropicais apresentam idade superior ao das rochas carbonáticas. Significa então que, após um longo período de glaciações na era Neoproterozoica, ocorreram mudanças climáticas.
A Terra entrou num período de superaquecimento, que derreteu as calotas de gelo, com alteração no nível eustático dos mares. Novos ambientes marinhos se formaram, a exemplo do mar Bambuí, que invadiu e se espalhou a leste da Chapada Diamantina.
Este período de transição, onde ocorreu o rompimento do supercontinente de Rodínia, é de extrema importância na história terrestre. A partir de 580 milhões de anos atrás, iniciou-se a fase conhecida como explosão Cambriana, com grande florescimento e diversificação da vida.
A partir do descongelamento surgiram mares rasos. Estas regiões marinhas abrigavam uma profusão vital, que posteriormente tornaram-se fósseis, fomentando as rochas carbonáticas.
Estes tipos de rochas são típicas de ambientes com temperaturas mais elevadas. Nos estratos rochosos, formaram capas sobre os sedimentos do período glacial.
Conclusão
Os críticos desta hipótese alegam que as rochas glaciais poderiam originar-se fora da região equatorial, e, em função da deriva, terem se movimentado e gravado o rastro magnético das latitudes mais baixas. Outros alegam a dificuldade de datação radiométrica ou o improvável congelamento de todos os oceanos em função dos sais e íons.
A existência de resquícios de rochas glaciais e formações ferríferas em diversos locais de regiões tropicais pode não ser uma completa comprovação do acontecimento da Terra bola de neve. Contudo, denota-se, em função das evidências, que o planeta foi submetido naquele período a prolongadas superglaciações.
Caso algum viajante espacial desavisado do pretérito trilhasse em sendas espaciais em proximidade à órbita terrestre, avistaria um planeta bem mais pálido do que ele aparenta ser na atualidade. Vislumbraria uma Terra com tons de branco gelo azulados.
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